BOLSA DE FORMAÇÃO DA INICIATIVA DO TRABALHADOR - NÃO DÍVIDA À SEGURANÇA SOCIAL - Parte 2

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BOLSA DE FORMAÇÃO DA INICIATIVA DO TRABALHADOR - NÃO DÍVIDA À SEGURANÇA SOCIAL

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Em 1998, altura conturbada da minha vida, estive na situação de trabalhador independente a recibos verdes, acarretando resmas de revistas e jornais pela noite e dia adentro na secção de acabamentos da tipografia Imprinter qual típica mão-de-obra barata desbaratada (250 escudos à hora).

Não exclusivo, também trabalhava como ilustrador numa revista, desenho aqui outro acolá, para um editor Marxista, figura de doido e aldrabão mas boa pessoa. Pançudo e barbas amante da comida. Curiosamente e em antagonismo ao pensamento da altura, hoje encaro-o como um dos patrões mais honestos que tive. Que é feito de ti ó Helder Pinho? Que é feito da tua "peida descomunal"?

Em prática estive a recibos verdes entre 1998 e 1999 não perfazendo um ano de trabalho. Burocraticamente, cessei-a em 2001, já nem sequer sabendo como ou porquê. Nos entretantos havia sofrido um esgotamento nervoso e toda a memória desses tempos transformou-se numa espécie de novelo turvo e abstracto dificilmente descortinável.

Legalmente é um período enguiçado com uma actividade que ficou pendente virtualmente durante uma média de três anos. Tal estaria já apagado da memória não fosse a candidatura à bolsa de formação.

O comprovativo de não dívida à segurança social, documento estipulado como requisito à candidatura da bolsa, É, "O" documento de todos eles, fundamental para que a candidatura à Bolsa de Formação alguma vez possa vir a ter efeito.

Não sabendo se tenha ou não tenha uma dívida à Segurança Social, dirijo-me aos balcões do ISS de Sintra querendo tratar o mais rapidamente do assunto.

Sou atendido por duas pessoas opostas: uma besta e um anjo.

A besta de olhos esbugalhados como um bezugo, trata-me como se fosse uma espécie de puto de rua, malandro à espreita de uma falcatrua qualquer, um gato pingado, um ranholas; fala-me ser necessário reabrir actividade independente pois não está declarado na Seg. Social, enquanto atira com panfletos para cima da mesa como quem doutrina a burocracia.

Desmancho-me a rir na frente da mulher desconcertado. Não saiba se deva ficar irado e arrumar a questão chamando alguém hierarquicamente superior ou se sinta algum interesse pela caricatura que está á minha frente que arrota nicles e nadas sobre continuarmos a conversa. Fui educado a encarar tal postura como cultural e até sinónima de simpatia. A hora já ultrapassa o horário. E tenho tanta vontade de esmurrar a mulher como de sair dali para fora. No entanto não deixo de sentir alguma simpatia, nem que fosse por ela viva, ser um dos símbolos delineadores do que está mal na sociologia portuguesa - um dos bonecos portugueses qual marioneta dum teatro para alienados. Saio do ISS frustrado.

Reincidindo, retorno ao ISS de Sintra, disposto a enfrentar a olhos esbugalhados, ainda que fosse necessário despoletar-se uma trovoada no meio da instituição. Desta vez sou atendido por um anjo, de olhos azuis de prontidão querente de ajudar e de sorriso quase enaltecedor. Sou encarado como um cidadão que necessita ser informado e encaminhado, mais, desenrola-se um diálogo por mais de 20 minutos debatendo-se todos os dilemas da situação que ia expondo. Descontraio-me e deixo de sentir que estou a falar para uma parede mal-educada.

Não existiam provas que tivesse cessado actividade antes da data que consta nas Finanças - 2001. Não fazia ideia onde estava o livro de recibos - que muito provavelmente o teria deitado fora pensando ser inútil. Pressentia-se a problemática de juros entre 1998 e 2001.

A senhora nada pode fazer sem uma prova.

Chegamos à conclusão que o melhor é escrever directamente ao Director da Segurança Social, pois o caso é periclitante...

Terminamos a conversa, à socapa gravo o nome da senhora no meu caderno para um eventual futuro elogio (Maria Luísa Machado), aperto-lhe a mão quase com vontade de a beijar na face e despeço-me aliviado por aquele momento de socialismo.


(continua...)

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